A senha pra vida

meus avósDirijo-me a um serviço público para checar uma informação. Ao entrar no amplo espaço, em cores branca e laranja, noto que várias pessoas aguardam devidamente acomodadas em cadeiras verdes. Olho e vejo que há um painel eletrônico, onde é exibida a senha. Então percorro o meu olhar por todos os cantos em busca de um equipamento para retirar a senha. Como não encontro vou até o balcão e me informo. A recepcionista gentilmente diz: – “é aqui mesmo que você retira e me entrega a senha.”

Sigo para me sentar em uma das cadeiras verdes para aguardar a minha vez. Olho para a entrada do espaço e observo uma senhora de estatura pequena, cabelos curtos e brancos como algodão, um pouco encurvada, mas caminhando com certa segurança. Ela está acompanhada de um garoto, esguio, com pouco mais de um 1,40 metro, que diz: – “Precisa de senha.” E, com atitude, dirige-se ao balcão. A senhora o segue e, em silêncio, aguarda, enquanto ele conversa com a atendente, que lhe entrega uma senha.

Ambos sentam-se em uma das cadeiras verdes para também aguardar atendimento.  E, a alguns metros de distância, continuo a observação. Enquanto a senhora fala, o garoto ouve com atenção. E é nítida a presença de carinho e amor na forma como se tratam.

Não resisto e me aproximo. Não! Não quero bisbilhotar a vida deles. Mas tenho necessidade de saber que laços os unem em tamanho afeto.

Dou um leve sorriso para a senhora e logo sou correspondida. Opa! Então me aproximo e converso rapidamente, antes que a minha senha apareça no painel.

E descubro que eles se chamam Zulmira e Bruno.  São bisavó e bisneto.

Faço questão de demonstrar minha admiração pelo comportamento do garoto. A bisavó também fica lisonjeada: – “Ele sempre me acompanha. É muito atencioso; se vou atravessar a rua segura na minha mão. É uma bênção”.

O Bruno é tímido. Com acanhamento, responde-me que tem 10 anos. E quando o elogio pelo carinho e cuidado com a bisavó, apenas sorri, revelando o uso de aparelho provavelmente para corrigir os espaços largos entre os dentes. 

São cenas assim que fazem o dia da gente melhor. Pois bate uma forte esperança de que as novas gerações possam cultivar o respeito e afeto por todos aqueles que colecionam experiências por décadas vividas. E assim aprender as lições que só podem ser transmitidas, sem pressa, por meio do brilho nos olhos, do abraço carinhoso e de uma boa prosa.

Nota: A ilustração de “Meus Avós”, obra de Lasar Segall.