A vida é feita de escolhas

A vida é feita de escolhas. Muitos de nós já ouvimos essa frase em algum momento de nossa existência.

E dia desses ela ficou martelando na minha cabeça.

Enquanto caminhava, em uma das raras saídas às ruas nesse tempo de pandemia, duas cenas me chamaram a atenção, primeiro porque ocorriam simultaneamente. Segundo, porque ambas tinham, absurdamente, discrepâncias e semelhanças. O local onde me encontrava era uma calçada ao lado de uma área de lazer, situada em frente à uma praça na região central.

Da calçada, olhei à esquerda e notei que um casal se aproximava de dois homens sentados em um dos bancos da praça. A moça, apesar do frio típico daquela manhã de inverno, vestia uma mini blusa e short, enquanto que o companheiro trajava camiseta, jaqueta e jeans. A moça falava alto e gesticulava muito. Estava visivelmente alterada.

Os outros dois homens sentados no banco, bem agasalhados, permaneciam sentados e cabisbaixos. Um outro homem, que vinha no sentido contrário, também se juntou ao grupo naquele banco da praça. Ele também gesticulava e, pelo movimento dos lábios, percebi que pronunciava algumas palavras. Mas pela distância não consegui ouvir.

A moça continuava a falar alto, dizia frases desencontradas, sem nexo.

Em pouquíssimos minutos de observação foi possível concluir que a cena, à minha esquerda, lamentavelmente, era protagonizada por um grupo de usuários de droga.

Dirigi então o meu olhar à direita e notei um casal que estava na área de lazer. A moça e o rapaz também vestiam regatas e shorts, apesar do friozinho daquela manhã. Não ouvi vozes daquele lado. Porém pude notar que conversam por causa dos movimentos dos lábios. O rapaz ensaiava alguns passos para corrida, enquanto a moça organizava alguns cones para treinamento esportivo. Num rápido instante, pude concluir que o casal, naquele lado direito da calçada, estava iniciando uma prática esportiva. Ambos estavam fazendo uso daquele espaço e daquele tempo que dispunham para fazer algo que poderia trazer alguma melhoria para suas vidas.

Voltei o meu olhar para à esquerda. A moça e os homens deixavam a praça e caminhavam, agora em silêncio, em direção ao um terreno baldio. Logo embrenharam-se num matagal.

O casal da direita continuou lá, focado na sua prática esportiva.

Sigo meu caminho. E me vem a velha frase: “A vida é feita de escolhas…”

Mas será? Talvez o casal tenha feito a escolha de estar ali realizando uma prática esportiva. Mas será que as pessoas do outro grupo tenham realmente feito a escolha por aquela vida indigna, sem vínculo familiar e miserável? Tanto as pessoas do lado direito quanto do esquerdo um dia foram crianças inocentes e cheias de sonhos.

E continuei a pensar que em tantas pessoas que um dia tinham uma vida estruturada, como diz no linguajar popular, “uma vida redondinha” e, de repente ocorre algo, a pessoa cai nos vícios e passa a perambular pelas ruas. Talvez a vida seja feita de escolhas. No entanto,  parece ser bem mais complexa que isso.