A senhora do fogão à lenha

Agosto é o mês do folclore. E lá vem mais um texto inspirado nos “causos” da minha mãe. (A primeira publicação foi o “Anão e a Mexerica”).

Não sei se alguém já ouviu, mas a história que vou contar é da “Senhora do fogão à Lenha”.

Cresci sabendo que minha mãe não tolerava palavrões. E até hoje ela tem essa opinião. “É muito feio ficar falando palavrões. Além de ser falta de educação, atrai coisas ruins. E coisa ruim não é bom a gente brincar.

E na algazarra do dia a dia, vez ou outra saía uma treta entre os irmãos e também escapava uns palavrões. O problema era quando ela ouvia. – “Ah é, falando palavrão? Depois não quero ver ninguém chorando quando a senhora aparecer durante a noite!”.

Pronto! Bastava este comentário para a gente ficar com a consciência pesada e ainda se borrando de medo de receber a visita da tal “senhora”. E logo vinha à imaginação a tal senhora punidora de crianças que falam palavrões. Sentada em um fogão à lenha, enquanto os caldeirões ferviam sob as chamas do fogaréu, a senhora não dizia nada, mas o seus olhos eram apavorantes. Não porque soltavam fogos, mas porque sabiam muito bem o quanto tínhamos sido desobedientes naquele dia. E só de pensar nisso era o suficiente para não querer, de forma alguma, cruzar com aqueles olhos inquisidores.

E quantas noites fui para a cama pensando na tal senhora, com sua roupa acinzentada, seu capuz sinistro e aquele inseparável cachimbo. E você pode até se perguntar: – A senhora era uma bruxa má, então?

Sim, com a imaginação fértil de uma criança, a tal senhora ganhava uma proporção tão temível, que chamá-la de bruxa, seria até um elogio.

Bom mesmo era quando a gente fechava os olhos e, depois de um dia cheio de estripulias, pegava no sono pesado que nem mesmo o pior pesadelo acordava. Caso contrário, mesmo depois de muito rezar, dormir com todas as luzes da casa acesas era pouco para espantar o medo de ter um encontro indesejado com a tal senhora sentada perto do fogão à lenha, pronta para assustar qualquer criança que por ventura acordasse em meio à escuridão.

Agora não me perguntem o “por quê” do fogão à lenha, se a gente estava no quarto de dormir? Oras, porque quando se trata de imaginação tudo é possível! Então se a senhora aparecesse sozinha não teria graça. E minha mãe, boa que era nessa coisa de inventar histórias, incluiu o fogão à lenha no cenário talvez por inspiração na história de “João e Maria”. Talvez porque fogão à lenha era um lugar muito familiar para todos, principalmente nas noites frias, quando muitos ficavam próximos por causa do calor que vinham das brasas estalando enquanto mantinham a comida aquecida.

E o ‘causo’ da senhora até que surgiu efeito. Eu raramente solto um palavrão. Salvo alguns momentos de distração em que o dedinho do pé acaba colidindo com alguma coisa que encontra pelo caminho.

Salve o Dia do Folclore! Salvem os causos e lendas que povoam o imaginário popular!

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