A menina da casa sem telhado

Aquela imagem vai ficar para sempre na memória. Era pouco mais de meio dia do domingo, o almoço ainda estava sendo preparado, quando um vento forte destelhou toda a casa e a chuva se derramou sobre cada cômodo. A mãe e as crianças, muito assustadas, correram para o banheiro, único lugar que permaneceu coberto.  Ali, todos ficaram paralisados, aguardando o temporal passar, para sair em busca de outro abrigo. Quando a tempestade se acalmou, saíram pela rua e se depararam com outras famílias, que também estavam desabrigadas.

A ajuda veio e as famílias foram temporariamente alojadas. Mas no dia seguinte a menina e sua família voltaram ao endereço. E ela entendeu que a sua casa já não podia mais abrigá-la. Dormir olhando as estrelas podia até ser uma grande aventura, mas só nos contos de fadas. Porque quando se trata de uma situação real, dormir numa casa sem teto é assustador, ainda mais quando não se sabe por quanto tempo as paredes vão se sustentar. E que a tempestade pode voltar a qualquer momento.

Enquanto os funcionários de uma empresa pública ajudavam na retirada dos pertences que restavam, a menina permanecia ali sentada na calçada, observando a entrada e saída daquelas pessoas entranhas. Na sua inocência, ela até achava novidade aquela movimentação. Vez ou outra fazia algumas perguntas, que eram ignoradas pelos adultos naquele vai e vem nervoso.  Ela queria saber para onde iam levar as coisas da sua mãe? Mas ninguém tinha tempo para responder a uma criança. Aquela gente grande estava muito ocupada.

A menina não tinha muito que fazer. Continuou sentada na calçada, lançando suas perguntas sem respostas, enquanto seus olhos observavam aquela gente grande e estranha carregando seus pertences e colocando num caminhão. A única coisa que sabia, mesmo que inconscientemente, é que, violentamente, sua vida mudou.

A tempestade havia passado. E a previsão indicava mais chuvas fortes nos próximos dias. Mas ela não entendia muito de previsões do tempo. Tinha só sete anos. Apenas sabia que naquele momento não tinha mais a casa que dividia com a mãe e os três irmãos. Agora o caminhão partia, sacolejando a precária mudança, e a menina e sua família seguiam juntos. E ela nem sabia para onde iam.